
Não são altas problemáticas - um drama com que o Serviço Regional de Saúde (SRS) se debate durante todo o ano -, mas abandonos temporários que, à medida que o Natal se aproxima, "agudizam-se" à porta das urgências, onde chegam dezenas de idosos nestas circunstâncias. "Nesta fase [de Natal], esta espécie de alta problemática é mais aguda, e acaba, na maioria, por ficar resolvida em Janeiro, quando os familiares vão buscar os idosos", explicou o director clínico do HCF, Miguel Ferreira.
O perfil destes idosos varia, desde pessoas que, mesmo sendo acompanhadas por familiares, vivem sozinhas, a outras, acamadas, que obrigam a cuidados continuados. "Não quero estar aqui a fazer juízos de valor, mas penso que estas situações acontecem porque os familiares querem ter mais disponibilidade para o Natal, e o hospital acaba por ser um escape", acrescenta Miguel Ferreira, lembrando que o SRS está a apostar no aumento da resposta da Rede Regional de Cuidados Continuados e Integrados (RRCCI).
O responsável por esta Rede, França Gomes, conhece de perto esta realidade. Sarcástico, diz que isto acontece devido ao "espírito natalício" e que o mal não é exclusivamente madeirense, mas sim português. "As pessoas ficam 'imbuídas' do espírito natalício e querem livrar-se dos pesos que estão em casa, para poderem ir jantar fora à-vontade", critica o ex-presidente da Ordem dos Médicos na Madeira.
França Gomes diz que podemos falar em "dezenas" de idosos nesta situação, para não falarmos numa "centena", enquanto Miguel Ferreira reconhece que o SRS tem poucos mecanismos para contrariar esta situação. "O que nós fazemos em relação às altas problemáticas é contactar a assistência social, para que possam ser encontrados os familiares destes idosos, mas, nestes casos, normalmente esperamos até Janeiro, já que a maioria regressa a casa após o Natal", diz o director clínico do HCF.
Até lá, o Serviço de Urgência é a 'porta de entrada' para estes idosos, e muitas vezes também a sala de espera. Segunda-feira, por exemplo, perto de duas dezenas de idosos dormiu nas urgências, a aguardar vaga no Hospital dos Marmeleiros. "A nossa capacidade é naturalmente limitada, e por isso vamos distribuindo as pessoas pelos serviços onde há vaga", diz Miguel Ferreira, acrescentando que existem também muitos internamentos motivados por casos clínicos. "O Inverno é sempre um problema para os idosos, que são mais frágeis à descida de temperatura", frisa Pedro Ramos, um dos responsáveis pelo Serviço de Urgência.
Já a RRCCI, lembra França Gomes, não é a resposta para estes casos. "A Rede foi criada para acolher idosos em fase intermédia de recuperação, não para estas altas problemáticas natalícias". Mesmo assim, a RRCCI vai aumentar a capacidade. Em Abril deverão estar disponíveis mais 30 camas no concelho do Funchal, e o objectivo é estender a Rede para concelhos que ainda não estão abrangidos, como Câmara de Lobos, Machico, Santa Cruz e Porto Santo. Os dois primeiros, segundo França Gomes, são prioritários, e já no próximo ano, o concelho de Machico, com a inauguração do novo Centro de Saúde do Porto da Cruz, deverá contar com seis camas.
in Diário de Notícias da Madeira 21 de Dezembro de 2008